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Dia Internacional da Luta Contra a Discriminação Racial demarca a importância do enfrentamento ao racismo

Data reforça a necessidade de políticas públicas e ações afirmativas para a promoção da equidade racial

Em 1960, na África do Sul, uma manifestação pacífica contra as leis segregacionistas impostas pelo regime do apartheid se transformou num verdadeiro massacre, que levou ao ferimento e à morte de várias pessoas, a maioria negra. Conhecido como Massacre de Sharpeville, o episódio ficou marcado na história e, em 1966, a Organização das Nações Unidas (ONU) instituiu o dia 21 de março como o Dia Internacional da Luta Contra a Discriminação Racial, em memória à tragédia.

No Brasil, um país fortemente marcado pelo racismo nas suas mais diferentes formas, o Decreto 65.810 de 8 de dezembro de 1969 estabeleceu a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, que em seu texto define “discriminação racial” como: qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência baseadas em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tem por objetivo ou efeito anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício num mesmo plano, (em igualdade de condição), de direitos humanos e liberdades fundamentais no domínio político econômico, social, cultural ou em qualquer outro domínio de vida pública.

Políticas públicas que garantam o enfrentamento à discriminação racial e promovam a equidade na sociedade são essenciais. São elas que amparam a população preta e parda contra os preconceitos e crimes sofridos, como descrito na Lei nº 7.716/1989, que define todos os crimes resultantes de preconceito de raça e cor.

Apesar de haver avanços significativos nessa seara, a discriminação racial ainda é uma questão grave e muito presente no contexto brasileiro, que diferentemente daqueles em que a segregação declarada levou ao racismo explícito — fazendo com que os grupos sociais tivessem suas identidades raciais reforçadas —, viveu uma narrativa de tolerância étnica, na qual a premissa de que todos são iguais perante a lei baseada na miscigenação e assimilação, resultou no racismo por denegação, termo usado pela filósofa e antropóloga Lélia Gonzalez para se referir ao racismo que não é assumido na sociedade brasileira.

Gisele Maria Rodrigues Machado é professora na rede estadual de Rio Grande desde 2007 e sua trajetória enquanto mulher negra e pesquisadora em educação reforça a importância das políticas públicas, sobretudo educacionais, voltadas para essas questões. Em 2012, quando assumiu a assessoria da Educação para as Relações Étnico-Raciais (ERER) na 18ª Coordenadoria Regional de Educação, Gisele desenvolveu várias formações continuadas para professores dentro das temáticas da Lei nº 10.639/2003, que estabelece a obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileira na educação básica; e da Lei nº 11.645/2008, que altera a anterior ampliando sua abrangência para a história e cultura indígenas.

A Política Nacional de Equidade, Educação para as Relações Étnico-Raciais e Educação Escolar Quilombola (Pneerq), uma medida implementada através dos esforços do Ministério da Educação (MEC) e da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão (Secadi), tem o objetivo de implementar ações e programas educacionais voltados à superação das desigualdades étnico-raciais e do racismo nos ambientes de ensino, bem como a promoção da política educacional para a população quilombola. À frente dessa política em Rio Grande em âmbito regional, Gisele reflete sobre a necessidade de reflexão sobre o tema. “Infelizmente nós ainda sofremos muita discriminação racial, principalmente no ambiente escolar. E através dessa consciência a gente também precisa saber que existem várias legislações que amparam as ações antirracistas nas escolas e como uma estratégia de desconstruir esse comportamento racista que muitas pessoas ainda têm e que a gente pode também se apoiar em várias políticas públicas para combater esse mal da nossa sociedade brasileira”, completa.

Em São Lourenço do Sul, a Coordenadoria Municipal de Cultura é representada por Charlene Santana Ferreira, mulher negra, quilombola, artesã, assistente social e mestranda no Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Territorial e Sistemas Agroindustriais (PPGDTSA) da UFPel. Charlene afirma que sua conquista da vaga na coordenadoria pertence ao movimento de consciência negra do município que, segundo ela, luta por uma representação negra dentro da gestão municipal há 40 anos.

Hoje, Charlene, que é a primeira mulher negra de tradição de matriz africana e quilombola à frente de uma coordenação de cultura na gestão municipal, leva para sua atuação toda sua história de pertencimento e militância do movimento negro que, segundo ela, vem desde seu nascimento. “A minha caminhada dentro dessa militância do movimento negro começou desde que eu nasci porque toda pessoa negra, a partir do momento que nasce, já nasce lutando, brigando em busca de alguma coisa boa pra nós e em busca de conquistas”, relata.

Diversidade na FURG

Na FURG, a Secretaria de Ações Afirmativas, Inclusão e Diversidades (Secaid) atua na promoção e ampliação das ações afirmativas, garantindo equidade e inclusão na universidade. Nesse sentido, a Comissão de Assuntos Afro-brasileiros desenvolve iniciativas voltadas ao reconhecimento e valorização da cultura afro-brasileira, bem como ao combate ao racismo institucional. Outras comissões atuam na acessibilidade para pessoas com deficiência, na promoção da equidade de gênero e diversidade sexual, e no enfrentamento de discriminações religiosas e geracionais. Além disso, a Secaid coordena ações formativas e políticas que fortalecem a inclusão em todas as áreas da universidade, como ensino, pesquisa, extensão e gestão de pessoas.

Trazendo a intelectual Grada Kilomba, reconhecida artista negra contemporânea de origem portuguesa, Elina Rodrigues de Oliveira, representante da Comissão de Assuntos Afro-brasileiros na Secaid, pontua que é necessário pensar que o racismo se baseia em um esquema que diferencia as pessoas por conta da sua cor de pele, estigmatizando aquelas que são negras, criando uma espécie de hierarquia social, onde as pessoas brancas estão em uma posição de superioridade com relação às demais. Para ela, o dia 21 de março propõe a discussão sobre a necessidade diária de pensarmos a discriminação racial como um dos fatores que sustentam a desigualdade e o racismo no país. “Esse trabalho em prol de uma sociedade mais igualitária é papel de todas as pessoas, principalmente das pessoas brancas, que, querendo ou não, são signatárias e beneficiárias desse sistema”, afirma.

Um compromisso contínuo

No Brasil, o dia 21 de março também é o Dia Nacional das Tradições das Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé. A data instituída pela recente Lei nº 14.519, de 5 de janeiro de 2023, reforça a importância da preservação e valorização das tradições e manifestações culturais das comunidades de matriz africana. Ao unir a luta contra a discriminação racial com a valorização das tradições afro-brasileiras, o 21 de março se consolida como uma data de resistência, reflexão e ação coletiva em prol de um compromisso contínuo: combater o racismo e promover a equidade.

Secom FURG

Foto: Ilustração de Alisson Affonso

 

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