Dois médicos são condenados por descumprirem jornada de trabalho no HU-Furg
A 1ª Vara Federal de Rio Grande condenou dois médicos radiologistas por não cumprirem a jornada de trabalho no Hospital da Universidade Federal de Rio Grande (Furg). Eles se ausentavam no horário de expediente para trabalhar em uma clínica particular. A sentença, publicada no domingo (14/5), é do juiz Gabriel Borges Knapp.
O Ministério Público Federal (MPF) ingressou com a ação contra três médicos e a então diretora do hospital narrando que os primeiros registravam a presença e depois se ausentavam do local, retornando no final do expediente apenas para registrar a saída no ponto eletrônico, não trabalhando as 24 horas semanais. Já a diretora estava ciente da prática, se omitindo quando devia e podia agir para evitar a atividade delituosa. Os fatos aconteceram entre janeiro de 2015 a setembro de 2015 e foram descobertos na Operação Raio X.
Durante a tramitação processual, houve homologação, em audiência, de acordo de não persecução penal em relação a um dos indiciados. Nele, as partes negociaram as cláusulas a serem cumpridas pelo acusado para, no final, ser extinta a punibilidade. Ficou estabelecido a prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas por oito meses e o pagamento de prestação pecuniária no valor de R$ 100 mil.
Em sua defesa, a diretora sustentou que as provas apresentadas na ação evidenciam que ela não tinha conhecimento de que os médicos se retiravam do hospital durante o horário de trabalho. Afirmou que jamais se omitiu do cumprimento de seus deveres funcionais e que sempre zelou para que os atrasos e faltas injustificadas fossem devidamente compensados, sob pena de desconto de salário.
Um dos médicos argumentou que dedicava 52 horas semanais ao atendimento da demanda do hospital e jamais percebeu horas extras. O outro declarou que era o único que emitia laudos atinentes às mamografias, tomografias e ressonâncias magnéticas, motivo pelo qual permanecia em sobreaviso 24 horas por dias sete dias por semana, totalizando jornada de 68 horas semanais. Eles alegaram que a direção do hospital concordou com o cumprimento da jornada pela quantidade de exames, com flexibilidade de horários, notadamente em razão do volume excessivo de trabalho e falta de pessoal.
Estelionato
Ao analisar o caso, o juiz federal substituto Gabriel Borges Knapp pontou que o crime de estelionato é caracterizado pela presença de quatro requisitos: obtenção de vantagem ilícita, para si ou para outro; prejuízo causado a outra pessoa; uso de artifício, ardil ou outro meio fraudulento; e indução ou manutenção de alguém em erro.
Para ele, as provas apresentadas no processo comprovaram o sistemático e deliberado descumprimento da carga horária de trabalho presencial dos dois médicos radiologistas. Os relatórios de vigilância produzidos pela Polícia Federal durante a Operação Raio X demonstraram que eles permaneciam, em média, 1h30 por dia no hospital, já que saiam do local para trabalhar em uma clínica particular.
“Com efeito, os réus obtiveram para si vantagem ilícita, em detrimento do Hospital Universitário, consistente na percepção das indevidas remunerações mensais pelo exercício das atribuições de médicos radiologistas, nos interstícios descritos na inicial acusatória, uma vez que, conforme comprovado, registravam o ingresso no hospital no ponto eletrônico, ausentavam-se pouco tempo depois e retornavam ao nosocômio ao final do horário de expediente para assinalar a saída no ponto eletrônico, utilizando-se desse ardil para fazer crer que haviam efetivamente trabalhado presencialmente durante todo o período a que estavam obrigados”, destacou o juiz.
Knapp ressaltou que a conduta de retornar ao hospital para registrar a saída no ponto elétrico “evidencia a intenção dos acusados de obter vantagem indevida e elide completamente a alegação defensiva de que não possuíam a obrigação de cumprimento de carga horária de trabalho presencial”.
Em relação à diretora, o magistrado entendeu que, a partir dos documentos e depoimentos anexados aos autos, não é possível concluir que a gestora tenha expressamente autorizado ou concordado com a conduta dos médicos de descumprir a jornada de trabalho presencial e registros indevidos no ponto eletrônico.
Ele julgou parcialmente procedente a ação absolvendo a então diretora e condenando os dois médicos radiologistas a pena de reclusão de três anos e quatro meses. Também foi determinado o pagamento de 214 dias-multa no valor unitário de ½ salário mínimo para um dos réus, e de 1/3 do salário mínimo para o outro.
A pena restritiva de liberdade foi substituída por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária de 100 e 80 salários mínimos. A sentença também decretou a perda dos cargos públicos. Cabe recurso ao TRF4.
Secos/JFRS
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