Inspira

O Velhinho na Cadeira de Rodas

Os pingos de água estalavam no meu capuz e escorriam pelas mangas da minha capa de chuva. Alguns pássaros aventureiros cantavam em pleno voo molhado e pareciam se divertir, enquanto eu caminhava até a parada de ônibus para mais quatro horas perdidas em um inferno do qual eu não tinha peito para me livrar.

No meio do caminho, uma casinha tímida de tijolos me espiava por sobre as lentes das janelas do primeiro andar, à medida que exibia seu morador solitário: um senhor de (provavelmente) oitenta anos sentado em sua cadeira de rodas, observando o que restou do movimento – da rua.

Eu o carregava no canto do meu olho, sempre buscando uma reação dele, porém, não importava se fazia sol ou se chovia: ele permanecia ali, como parte da mobília de jardim do avarandado, em uma casa que parecia afundar com as areias do tempo.

A gravidade mexeu suas cordas invisíveis e a parte de baixo da ampulheta se encheu. As estações trocaram de lugar, acredito que mais duas vezes; a casinha fora demolida e o terreno posto à venda.

Espero que ele tenha, finalmente, se livrado daquela cadeira.

Autor: Pedro Porciúncula/Inspira

Foto: Pixabay

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