Roupas no varal
A janela do meu quarto dá para o pátio da casa. Como choveu naquele dia, minha mãe deixou a roupa para secar durante a noite. Entre os tecidos pendurados, está a cortina da minha janela.
Com a cabeça no travesseiro, olho as estrelas. Estou coberto por um fino lençol, já que as noites aqui costumam ser quentes. Meu cachorro, Bolota, está deitado aos meus pés, sonhando com ossos, imagino.
Vejo as roupas dispostas na corda, que atravessa nosso pátio. Um sobretudo balança com a brisa. Os botões, redondos e brancos, se sobressaltam na cor escura da vestimenta.
Meu cachorro desperta e vai até a janela. Ele chora com o focinho apoiado no parapeito; pergunto o que foi e acaricio suas orelhas. Claro, não recebo resposta. Ia ser estranho se o cachorro falasse.
Sem perceber, adormeço.
Acordo sem a presença do cão. O relógio marca onze horas.
Levanto, lavo o rosto e vou perguntar à minha mãe se ela viu o Bolota. Ela responde que meu pai acabou de sair para procura-lo. Então, me pede para dobrar a roupa que já foi recolhida, pois ela precisa preparar o almoço.
Quando terminei a tarefa, um pensamento gozado me veio à cabeça, uma sensação de estranheza quase similar ao pressentimento de perigo. O mal-estar coincidiu com a chegada do meu pai, que entrou em casa esbaforido, ainda carregando a tigela cheia de ração.
Olho para as roupas e confirmo meu pensamento:
Não tem um sobretudo naquela pilha de roupa dobrada.
Autora: Ingrid Contreira/Inspira
Foto: Pixabay