Ultimato
Ou tu ou eu. Os dois, eu irrompo em descaminhos de mim, ou te interrompo no caminho da saída.
Meu ultimato não tem natureza destrutiva, é antes pedido de reconciliação. Dois cansados, dois rasgados, dois que não são mais do que quebrados. Quem vê de longe, ou chora ou ri; há tempos eu choro e tu disfarças uma risada que, em estado natural, sairia a plenos pulmões.
Meu ultimato é faca, mas faça-me o favor de aparar a ponta. Quando eu desfechar o golpe final, rezo que tu não te irrompas em descaminhos de ti, que eu não te cinda como tu me tiveras cindido. Gosto assim: de mim, sai apenas o que tu podes aguentar. Eu já não te posso segurar, já não te quero imaginar, já não confio em minha força. Não confio em nada mais que, antes, eu achava poder confiar.
É muito verbo pra pouco ultimato. Quem desfecha o golpe, não quer pingos nos is: tem a redação completa. Redijo meu ultimato como quem grita, entrego-te em mãos como quem mata. Enquanto lês, retiro-me do recinto como quem deixa alguém que nunca deveria ter (se) deixado ir.
Meu ultimato é espelho de ti. Minha reza é somente uma: espero não te deixar, quando eu te deixar. Afinal de contas, a contradição sempre tivera sido a nossa marca registrada, não?
Autor: Eduardo Moll/Inspira
Foto: Pixabay