Inspira

Você é o que você come

O criador observava a criatura.

O inventor amador, que era chamado de louco por todos, criou Evans pelo desejo de ter alguém a quem amar. Para fazê-lo, usou o molde do próprio corpo, de maneira que o robô tivesse sua mesma altura; a carcaça foi feita dos melhores metais que pôde conseguir, afinal, queria um filho forte e saudável. No momento, Evans assistia, estático, a um programa culinário.

Sorriu diante o fascínio da criatura para com aquele programinha bobo. A inteligência artificial de Evans, feita com a memória de alguns aparelhos eletrônicos, se assemelhava à de uma criança, portanto, ele não tinha rédeas na hora de expressar sua opinião sobre alguma coisa.

Por fim, o criador virou-se para retornar ao que estava fazendo antes de ir checar como Evans ia indo.

— Lembre-se: você é o que você come. Por isso, use ingredientes frescos.

Aquela frase, sempre proferida pelo chef na despedida do programa culinário, fazia os olhos cinzas reluzirem. O robô moveu a cabeça giratória na direção da porta da sala onde seu pai trabalhava. Evans tinha um plano em mente.

A criatura observava o criador.

O inventor, que estava usando o computador, sentiu uma mão grande e gelada no ombro. Quando se virou, só teve tempo de ver sua criação vir para cima de si. Os dentes metálicos se cravaram na pele, rasgando a carne humana com a agilidade de uma faca de açougueiro. Evans arrancou um pedaço grosso e o engoliu, sem aparentar remorso.

Evans queria ser humano.

Autora: Ingrid Contreira/Inspira

Foto: Pixabay

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