Vozes e corpos que (trans)bordam e somam à luta dos direitos das mulheres
Pluralidade, representatividade e a contribuição da educação superior pautaram a abertura do Março Lilás na FURG
Um Março Lilás diferente, construído de forma intensa e virtual por muitas mãos e sob o signo da pandemia do Coronavírus, apresenta à comunidade uma agenda de atividades baseada no encontro digital. Bate-papo, palestra, aula, exposição, show: todas as ações previstas para ressaltar o mês de lutas de mulheres vão cruzar as telas. E impactar. Na noite de ontem, 8, Dia Internacional da Mulher, a live “Mulheres que ressoam: vozes e corpos que (trans)bordam” marcou a abertura oficial da programação do evento na FURG.
Com mediação da professora Juliana Lapa Rizza, do Instituto de Educação (IE) e integrante do Grupo de Pesquisa Sexualidade e Escola (Gese) da FURG, o debate reuniu convidadas vinculadas à universidade, discutiu as múltiplas maneiras de fazer-se mulher e ocupar espaços sociais no mundo, e levantou pautas que unem mulheres por perspectivas diversas além do gênero, como saúde, violência, garantia de direitos, equidade, entre outras.
“A live de hoje não tem como proposta determinar sentidos; a gente não vai determinar e muito menos terminar o debate”, alerta Juliana, apontando a direção da conversa pelo caminho da pluralidade de vozes. Cassiane Paixão, professora de Sociologia do Instituto de Ciências Humanas e da Informação (ICHI), é a primeira a contar de sua experiência e propõe uma retrospectiva respeitosa com relação à vida das mulheres, principalmente das oriundas de comunidades tradicionais e negras no contexto da pandemia. “Mais uma vez a gente chega num 8 de março pautando sempre a luta pelas nossas vidas”, atenta. Junto das questões que unem mulheres, sobre direitos, “é sempre bom lembrar que nós não somos homogêneas, nós somos únicas e vamos ter as nossas pautas”, disse.
Fernanda Fonseca, assistente social e diretora do Centro de Atenção Integral à Criança e ao Adolescente (Caic) da FURG, falou sobre violações de direitos das mulheres e meninas e de como políticas sociais são tratadas de forma assistencialista e clientelista no Brasil. Para ela, “a efetividade e a eficácia de políticas públicas que são voltadas para mulheres e meninas depende de uma articulação que é intersetorial e que deve ser apoiada pelos fundamentos do nosso Estado de Direito, que parece que não vem tendo muita atenção. Então, garantia de direitos hoje em dia deve ser uma bandeira de luta das diferentes frentes”.
As considerações de Daniele Acosta, professora da Escola de Enfermagem (EEnf) da FURG e líder do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Enfermagem, Gênero e Sociedade (GEPEGS) foram sobre violência doméstica contra a mulher, pandemia e saúde. Com informações de boletins epidemiológicos recentes, Daniele destacou a necessidade do recorte de raça e gênero para a análise da conjuntura e a criação de políticas públicas para equidade.
Maria Regina da Conceição Moraes, a vereadora Regininha e estudante do curso de Pedagogia da FURG, trouxe ao debate questões da travestilidade e da transexualidade. Problematizou a incompreensão do significado do dia 8 de março e a consequente invisibilização do avanço na luta das mulheres por espaços de poder e a vivência de mulheres travestis e transexuais, em especial na pandemia.
Somar para amplificar vozes
Regininha deu testemunho potente sobre a experiência transformadora que o acesso à universidade significa para ela. “Eu acredito que a minha chegada no curso de Pedagogia [e de outras pessoas trans] é exatamente pra que a gente possa sair da universidade e ocupar essa escola [de educação básica], e realmente ter esse lugar de fala com muita propriedade”. E sobre a presença trans cada vez mais expressiva na formação docente inicial, avalia: “o quanto isso soma ao nosso debate, o quanto soma para o nosso discurso, o quanto soma para a sociedade”.
“O curso de Pedagogia, com muito carinho, com muita paciência me ressignificou isso [a relação com a infância]. É como se eu tivesse feito as pazes com o meu passado, com a minha infância e com a minha adolescência. Esse curso me transformou”. Regininha partilhou sua vivência trans e acrescentou à pauta das mulheres a importância da universidade: “eu sou uma pessoa nova hoje, eu sou uma mulher com muita felicidade. Eu conheci a felicidade no curso superior. E eu nunca pensei que fosse chegar a este lugar. E outra coisa que a universidade também me trouxe foi a interação com pessoas cis. A universidade também ressignificou isso. É um grupo de pessoas que me acolheram bem e que podem ser minhas amigas, também podem somar comigo”.
Reflexão e ação
A última rodada da conversa foi momento de reforçar as reflexões promovidas na live e alinhavar parcerias entre as participantes, propondo a continuidade permanente do debate e um salve às mulheres que estão na linha de frente na área da saúde, depois de mais de 250 mil vidas perdidas pela Covid-19. “Que a gente possa olhar para as interseccionalidades, que as marcas biológicas não nos definam”, ressaltou a mediadora. “E que a gente possa se encontrar nas lutas que ainda estão por vir”, encerrou.
Confira a programação completa do Março Lilás na FURG
Assessoria de Comunicação Social da FURG
Foto: Reprodução